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O Fio da navalha (The Razor’s edge), de W. Somerset Maugham

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W. Somerset Maugham (1874–1965) segue a trilha deixara por Hermann Hesse em apresentar a cultura e o misticismo oriental para o Ocidente. Em O Fio da navalha (1944) esse encontro (e choque) de culturas dá-se por curiosidade num meio-termo geográfico entre elas, a Europa.

A história, contada por um britânico, foca-se num primeiro momento em Eliott, um americano que obteve sucesso na alta sociedade parisiense do início do século XX, e o acompanha a Chicago numa visita familiar desse personagem. Essa primeira parte, ocidental, é destinada à apresentação dos personagens dentro daquilo que o narrador, o próprio Maugham ficcionalizado, percebe ser o espírito americano.

A modo de desculpar-se por qualquer falha na caracterização dessas criaturas, diz: “É difícil a gente compreender bem as criaturas e não creio que possamos conhecer ninguém a fundo, a não ser nossos próprios compatriotas”*, pois tanto nessa primeira parte americana, quando na segunda, sob a influência da Índia hinduísta, o autor lida com culturas das quais não é natural.

O que me cativa na primeira metade do romance e que para mim tornou tão cansativa a segunda é que partimos da ironia e da crítica de costumes, com diálogos mordazes como:

“A mobília, de carvalho preto, era pesada e opressiva.
– O que o senhor acha? – perguntou Isabel a Gregory Brabazon, quando nos sentamos.
– Não duvido que tenha custado um dinheirão – respondeu ele.
– E custou mesmo – declarou Mrs. Bradley. – Foi-nos dada, como presente de casamento, pelo pai de meu marido. Tem nos acompanhado pelo mundo inteiro. Lisboa, Pequim, Quito, Roma. A boa rainha Marguerita admirava-a muito.
– Que faria o senhor com ela, se fosse sua? – perguntou Isabel a Brabazon.
Eliott antecipou a resposta.
– Queimava-a.”

para chegarmos a uma longa discussão filosófica sobre a existência e o propósito da vida. Não digo que não me agrade tal discussão; pelo contrário, essa inclinação metafísica de O Fio da navalha foi muito aguardada para chegar à sua conclusão. O que não me agrada é o modo como se passou de uma coisa à outra.

E como se deu essa transformação?

Na vista a Chicago, Maugham conhece Isabel, a sobrinha de Eliott, uma jovem estadunidense encantadora, e seu noivo, Larry. Ele participara como aviador na 1ª Guerra Mundial e tem uma personalidade tão tranquila quanto angustiada.

Logo ele se torna o foco da narrativa e todas as ações subsequentes ocorrem para de alguma forma se abordar este personagem. Nisso cresce uma amizade entre ele e o narrador, o que nos permite adentrar em seus mistérios por meio de longos e esparsas conversas ao longa da obra.

Numa dessas conversas Larry revela porque se sente aflito. Durante a guerra um companheiro seu perdera a vida para salvá-lo. Isso foi seu “fio da navalha”, expressão usada para definir um momento decisivo e com dificuldade na vida de alguém. Vem da epígrafe do livro, um verso dos Upanixade “O caminho (para a salvação) é difícil de atravessar como o fio de uma navalha (lâmina), assim dizem os sábios”.

Larry então abre mão de se noivado com Isabel para perseguir a sabedoria. Ela, de natureza muito mais prática do que a dele, casa-se com um rico conhecido e parece satisfeita, embora mantenha fortes sentimentos por Larry.

Com a crise econômica de 1929, Isabel e seu marido, Gary, mudam-se para Paris, como foi de costume entre os estadunidenses, especialmente os ilustres. Lá eles se encontram diversas vezes com o tio de Isabel, com Larry – ora aqui, ora acolá – e com Maugham.

O resto do romance gira basicamente em torno desses encontros, com exceção de alguns diálogos reveladores. Enquanto isso, o fascínio do narrador por Larry continua, com relatos sobre suas aventuras e meditações nas bibliotecas de Paris, nas minas de carvão francesas, num monastério alemão, até seu refúgio espiritual na Índia.

Gradualmente o centro da narrativa desloca-se da frivolidade e da vida de aparências em que personagens como Eliott vivem, para as dúvidas existenciais de Larry e sua procura por uma iluminação interior. No entanto, esse peso filosófico diminui o vigor da escrita e torna (para mim) a leitura cansativa, mesmo com a ocasional inserção daquele humor primeiro, como em “o casamento continua sendo a melhor profissão para a mulher”.

Muitas pessoas consideram a mensagem de O Fio da navalha maravilhosa – e eu não discordo delas. Porém o livro não funciona tão bem em termos de narrativa, pois não consigo sentir empatia por um personagem de presença tão inconstante e que, embora os demais se refiram a ele como intelectualmente aflito, está longe de apresentar a aflição de um Lobo da estepe.

Isoladamente, essa perscrutação existencial é de fato brilhante, mas no contexto deste romance ela tira um pouco da emoção que os causam os capítulos iniciais. Ainda é interessante ver os vários extremos representados nas figuras de Eliott e Larry. Um é o terreno; outro é o etéreo. Um vive para a sociedade; o outro prefere a reclusão. Um é a aparência; o outro é a essência. A religião de um é uma questão de status, enquanto para o outro é a busca por uma verdadeira experiência espiritual. Contudo o final permite uma leitura otimista para ambos os personagens, apesar das suas diferenças.

O que me faltou realmente foi ter empatia pelo protagonista (da história e protagonista desses questionamentos). Ou talvez eu seja demasiado ocidental.

*O Fio da navalha (The Razor’s edge), de W. Somerset Maugham, traduzido por Lígia Junqueira Smith para a Editora Rio Gráfica.


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