Quantcast
Channel: Livro – Clássicos Universais
Viewing all articles
Browse latest Browse all 16

O Alienista, de Machado de Assis

$
0
0

O forçamento e a inadequação ao apresentar Machado de Assis (1839–1908) ao público brasileiro torna a leitura desse grande escritor um fardo, ao invés do prazer que verdadeiramente é. Este texto trabalhará no sentido de informar ao leitor que desconhece por completo a obra machadiana e também àquele que o achou maçante numa primeira leitura. Para tanto, falarei de O Alienista, que aparece na obra Papéis Avulsos (1882), já na fase realista do escritor, considerada também a de maior maturidade.

Primeiro, o que se há de reparar são os cenários e a linguagem da época. De um vocabulário rico, sem ser exagerado, Machado revela-se um desafio ao leitor acostumado às leituras nada exigentes. Um feliz desafio, é claro, pois sua leitura gratifica o leitor com o enriquecimento de sua expressão.

Muitos têm a curiosidade de saber como é a experiência de ler grandes escritores em seus idiomas originais: Balzac em francês, Dickens em inglês, Goethe em alemão… Pois em Machado de Assis há a oportunidade de ler-se um mestre em português. E prestar atenção não somente ao que se descreve, mas também a como se escreve, traz suas recompensas. Metade do que acontece nas obras dele é ação, enquanto outra é sentido, é sutiliza da língua.

Quanto à ambientação de suas obras, não se pode pedir que escrevesse seus romances passados no século XXI. Entretanto, não se duvide de sua contemporaneidade. O Brasil de Machado de Assis em 1880 está mais próximo do Brasil de hoje do que muitos escritores atuais têm procurado representar.

É aí que chagamos a O Alienista, conto breve e belo exemplo da segunda fase literária do autor. Em Itaguaí, Rio de Janeiro, reside o ilustre médico Simão Bacamarte. Comparado a Hipócrates, o pai da Medicina moderna, Simão está mais próximo de um Messias da ciência, por sua devoção à causa científica.

O foco de sua medicina está nas doenças psicológicas e por isso constrói em Itaguaí um hospício, a Casa Verde, onde possa tratar os enfermos mentais. Até esse momento o texto apresenta os personagens e a cidade, com a eventual dose de ironia do escritor.

Em seguida, quando Bacamarte passa a recolher a maioria da população para tratamento, sob a escusa de estarem loucos, então O Alienista transforma-se numa crítica refinada à vida política e social no país. Pequenos costumes não escapam à percepção de Machado, como a demora em se pagar empréstimos. Tampouco se restringe à questão financeira; quem dos leitores já emprestou um livro, um filme, e não viu mais sombra disso? Pois esse leitor se identificará e achará graça de uma passagem como:

“Mas isso mesmo acabou; três meses depois veio este pedir-lhe uns cento e vinte cruzados com promessa de restituir-lhos daí a dois dias; era o resíduo da grande herança, mas era também uma nobre desforra: Costa emprestou o dinheiro logo, logo, e sem juros. Infelizmente não teve tempo de ser pago; cinco meses depois era recolhido à Casa Verde.”

A inteligente virada da obra ocorre quando, depois de constatar que dois terços da população encontrava-se sob seus cuidados, Simão Bacamarte conclui que o certo na verdade é ser errado da cabeça, ou seja, a loucura é o padrão; a sanidade, exceção. E então fez liberar todos os ex-loucos e passou a caçar todo aquele que fosse são, justo e leal, porque estes sim formavam uma exceção.

É isso o que temos de mais brasileiro até hoje: o erro institucionalizado, consagrado pela maioria. A injustiça, a corrupção, a fraude, o desvelo, a intriga, a fofoca… tudo isso considerado a norma padrão em nossa sociedade. Ai daquele que tenha retidão ou se oponha a tais práticas, este sofrerá de exclusão pior que a de residir na Casa Verde.

Assim se constitui O Alienista, obra provocante e cheia de sutilizas. Simão Bacamarte pode ser o protagonista, mas o maior personagem ali é a própria sociedade, o conjunto de todos os personagens que habitam o universo desse conto. Focado principalmente no convívio social e político, Machado imagina com pena perspicaz e cômica como a loucura tornou-se via de regra em nossas terras.

Esse é um aspecto pouco comentado sobre ele – Machado de Assis é engraçado. Não são muitos escritores que podemos ler por serem excelentes e, ao mesmo tempo, podermos lê-los por prazer alegre, para rirmos. No entanto a graça de Machado está mais na ironia discreta do que na chalaça, na zombaria exagerada, recomendada por um outro  personagem de Papéis Avulsos*.

E Machado é crítico. É um jornalista do Brasil daquela época a escrever para o futuro, até mesmo para nós de agora, sobre um povo e uma terra dos quais viemos e que ainda tempos muito em comum.

Eis o Machado que deveríamos ler: atual, inteligente, popular e engraçado.

*Final do discurso do Pai, no conto Teoria do Medalhão.


Viewing all articles
Browse latest Browse all 16

Latest Images

Pangarap Quotes

Pangarap Quotes

Vimeo 10.7.0 by Vimeo.com, Inc.

Vimeo 10.7.0 by Vimeo.com, Inc.

HANGAD

HANGAD

MAKAKAALAM

MAKAKAALAM

Doodle Jump 3.11.30 by Lima Sky LLC

Doodle Jump 3.11.30 by Lima Sky LLC

Trending Articles


Ang Nobela sa “From Darna to ZsaZsa Zaturnnah: Desire and Fantasy, Essays on...


Lola Bunny para colorear


Dino Rey para colorear


Girasoles para colorear


Dibujos de animales para imprimir


Renos para colorear


Dromedario para colorear


Love Quotes Tagalog


Mga Patama Quotes at Pamatay Banat Quotes


RE: Mutton Pies (mely)


Gwapo Quotes : Babaero Quotes


Kung Fu Panda para colorear


Libros para colorear


Mandalas de flores para colorear


Dibujos para colorear de perros


Toro para colorear


mayabang Quotes, Torpe Quotes, tanga Quotes


Long Distance Relationship Tagalog Love Quotes


Love Quotes Tagalog


Mga Tala sa “Unang Siglo ng Nobela sa Filipinas” (2009) ni Virgilio S. Almario





Latest Images

Pangarap Quotes

Pangarap Quotes

Vimeo 10.7.0 by Vimeo.com, Inc.

Vimeo 10.7.0 by Vimeo.com, Inc.

HANGAD

HANGAD

MAKAKAALAM

MAKAKAALAM

Doodle Jump 3.11.30 by Lima Sky LLC

Doodle Jump 3.11.30 by Lima Sky LLC